sábado, 19 de julho de 2014

O dia vai terminando





No campo, o final de um dia ensolarado de inverno tem cheiro de terra, grama seca e dourada, sons distantes e fumaça de grimpa queimada. O sol indo iluminar outros quadrantes da terra e a sombra negra da noite se aproximando lenta e decidida, como uma maré que nunca falha. Os bichos alterando o canto, mudando de lugar, procurando abrigo para o período que se aproxima e a temperatura informando que a noite será fria. Orvalho começa a se formar e a roupa do corpo parece molhada ao toque, fria e úmida. A visão vai diminuindo e o horizonte encurtando, como se estivesse me empurrando para o abrigo da casa. Hora de alimentar o cachorro e abastecer de lenha o cesto para garantir o calor na casa durante a noite, que vem a galope e sem obstáculos. O frio no rosto já prenuncia o que vem.

Recolhido em casa, o fogo na salamandra vai espalhando o calor pela sala trazendo conforto e segurança que só o fogo pode. O cheiro de pão que emana do forno torna perceptível a magia operada na farinha pelo fermento e o calor, tornado aquela massa pálida, densa e fria, num pão dourado e aerado, leve, aromático e saboroso. Casa quente, pão pronto e exalando todo o perfume de sua alquimia, ponho na mesa o que vai me garantira a noite: pedaços de pão novo, fatias fina, muito finas de uma copa defumada, queijo serrano e uma manteiga amarelinha de dar gosto ainda maior ao pão. A taça de vinho embala tudo e leva ao estômago a energia que me garantirá o calor da 
noite.

Mais lenha na salamandra e uma olhada para fora mostra sombras negras sobre um campo prateado, denunciando uma lua cheia de respeito. Como um espelho redondo e irregular, o astro vai refletindo a luz do sol que ela ainda alcança, por estar mais alta. O vento brando e gelado faz o convite e me apronto com um abrigo grosso e boné. Pouco depois o xulé, meu cachorro parceiro, e eu estamos sentados no meio do campo, de frente para o disco iluminado da lua fazendo um brinde de um bom vinho com a noite. Fico ali até o frio me tocar de volta para a casa quente. O xulé assume seu posto de guarda externo, deitando na frente da porta da casa ao abrigo da área.
O dia que se foi trouxe a noite para compensar. Parece que ela quer mostrar que, quanto mais escura, fria e enluarada, mais vontade me dá de que venha logo um novo dia, claro e quente.  O sono vem ajudar nisso, abreviando o tempo e logo terminando com a noite, assim que domina o meu corpo. O sono é uma boa forma de abreviar a noite.


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